segunda-feira, 20 de maio de 2019

Memorial

Até onde nosso cérebro é capaz de guardar lembranças?
Que tipo de lembranças guardamos? Alegres e tristes?
O quanto nós sabemos de nossa família?

Em algum momento da minha vida comecei guardar memorias. Lembro de coisas de quando tinha uns 2 anos de idade, como e porque?
Já tenho lapso de memorias de tempos enormes bem mais recentes. O nosso cérebro é inteligente o suficiente para decidir por nós o que é importante e o que não é.

A minha mãe sempre aumentou o tempo de tudo ou reduzia o tempo a quase nada . Até hoje para falar as horas elas sempre aumenta o tempo do que é real. Se são 19h10 ela diz que já são 19h30 ou que já são 20h... É um exercício de paciência para mim.
Nesta relação que tenho com a minha mãe, também tive que aprender a lidar com o tempo dela correr mais rápido que o meu, mesmo que eu ande mais rápido que ela, a minha mãe sempre está acelerada com um coração que bate bastante disritmado por conta da angina. 

Guardo memórias do tempo da infância, que vez em quando vem a tona e me fazem chorar. Principalmente das tantas viagens que fiz ao Rio Grande do Sul- da infância a adolescência, quase sempre no verão, algumas no inverno e apenas uma na primavera. 
Cada viagem uma história, cada parada em um casa uma coleção de aventuras, cada visita a um parente distante um perfume e um sabor, um elemento decorativo, uma experiencia sensorial.
Lá se vão 25 anos que não faço mais essas viagens desse jeito.
Cheguei a ter raiva de viajar, de não querer mais. De ter briga com o relógio e com o mundo. Fiquei 5 anos sem ir ao Rio Grande do Sul nos meus tempos mais austeros de dinheiro e tristeza .
Não se corta laços afetivos de vida tão fáceis assim, como se deixa de beber, fumar ou ter qualquer outra bengala de vida.

Memorias são feitas de sensações, de emoção, de laço. 
Lembro de coisas de todos os tipos - agora mesmo lembrei de quando os netos da proprietária da casa onde eu morava quebraram um liquidificador de brinquedo que eu tinha, colocando pedras dentro dele. As outras crianças eram mais velhas que eu. A minha mãe brigou comigo porque ela tinha falado para não emprestar nada para ninguém, na verdade eu não emprestei só mostrei, mas eles pegaram e colocaram as pedras e ligaram o brinquedo que era a pilha... Chorei pela minha ingenuidade, tinha 5 anos. Os netos da vizinha 6 e 7 anos.   
Porque lembrei disso?
Pois sou ingenua em achar que você do outro lado deste texto pode ser alheio a isso tudo que escrevo ou acreditar que essas histórias só servem a mim.
Esses dias mesmos precisei fazer um trabalho para faculdade sobre experiências no cinema. A minha mente fez um nó.
Um nó por conta das lembranças. A cada coisa que lembrava vinha outra coisa em outro tempo com a mesma intensidade. 
Sofri para escrever sobre aquelas lembranças, não pelos pelos detalhes, mas porque eles vinham cheias de coisas que não sei explicar, que não estavam na tela do cinema, estavam em me fazer lembrar que em algum momento da vida tinha de fato alguém para conversar comigo sobre as emoções que estava vivendo vendo aquele filme.
Hoje viajo, vou ao teatro, cinema, eventos, lugares sozinha. As emoções e as histórias que vivo são exclusividade minha, num egoismo profundo. Não me dou mais trabalho de convidar ninguém.
Divido aqui um tanto dessas histórias, as reais e as que crio, mas compartilhar as minhas vivências num tempo real é coisa para poucos.

A psicologa esses dias me perguntou se além de contar as minhas tantas histórias, se também crio. Ainda não falei dela do blog e nem da morte prematura dos sonhos de escritora aos 17 anos. 
Escrevo mal. Tenho consciência disso, porém não largo essa bengala desde dos 12 anos, quando tive o meu primeiro diário e os prazeres da poesia. 
Isso aqui não é esconderijo, isso é janela para rua de uma casa pálida e sem jardim.

A memoria pode falhar. O que não pode falhar é a emoção. De quando vemos um amigo de longa data que mora longe, saber que esta bem. Um tio ou primo quando se fala ao telefone é diz que está com saudade.... doí porque vc também sente saudades do que foi e daquilo que também não será. 
Sofro de uma saudade eterna, de uma enorme coleção de histórias. O que me acalma é saber que todos os dias, todos os dias  mesmo poderemos contar histórias reais novas, mesmo que esqueçamos todas as outras histórias, tanto boas quanto as ruins. 
O que vai nós restar são as emoções  - o amor, a alegria, a surpresa, a raiva, a dor, a paciência, a paixão, o desejo e o sonho. Essas coisas a memoria não apaga, pois quem cuida é o coração.

Outro dia venho aqui e conto um pouco mais da minha vida, tem sempre um curioso que gostar de saber.
Sei que quem vive de passado é moinho. Mas moinhos geram energia. Eu guardo dentro de mim um pequeno gerador.  

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