segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

O corpo, o observador e a morte

Em estado de transe, o corpo permanece cambaleante pela calçada. Ninguém o orienta ou segura sua mão.
Entre um passo e outro, as imagens são turvas e sem sentido. O chão já é o seu destino certo.
Já no chão, sem sentidos, ninguém mais o vê. Sua mente já se perdeu em alguma ilusão qualquer. A morte pode ser assim sem dor, insólita e desprovida de realidade mais cruel que a solidão e o esquecimento.
O corpo é chutado, mutilado, desfeito em ossos - e ninguém viu.

Longe da cena. Alguém observa tudo como um sentenciador da morte e que ela foi justa e de nada poderia fazer para mudar. O Observador julga-se certo, por não intervir, não falar e não agir em nada que mudasse o estado do corpo.

No fim era apenas um corpo.
Eu sou apenas outro corpo, que não tenho nenhum domínio sobre o outro, prezo pela liberdade da morte e da vida, independente de como ela aconteça... Sou o Observador - um deus a parte da miséria - isento de tudo que ocorre.

Numa frágil cortina de ações e não ações, todos morrem dentro dos seus mundos, assoberbados com suas verdades.
Quem faria algo pelo corpo?

No limite da razão a vida não vale mais quase nada. Morrer continua sendo mais fácil e barato que nascer.
Existir - é mais que nascer, é nascer e provar que é algo vivo, com memoria e tempo.
O corpo nem existiu.

Quanto existimos? Ou deixamos de existir? A nossa miséria não permiti ir muito longe de alguns metros de onde viemos, e quando vamos é dito que é sorte. Sorte....

O corpo não existe mais, só uma vaga lembrança na cabeça do Observador... e quando essa deixar de existir, o corpo terá morrido de vez. Assim como tantos corpos morrem todos os dias, esquecidos de tudo e de todos... Sem lembranças.

Eu sou o corpo. Como tanto outros corpos. Que morrem e vão morrer neste silencio do esquecimento e dos laços soltos da vida. Pois na solidão dos passos nada conseguira reduzir ou mudar a rota de colisão com o chão.

Quando os laços são estreitos, a família, e os tais amigos dos corpos estão juntos - outro vinculo se cria - o observador deixa de olhar com atenção e diz a si mesmo que tem quem olhe por ele. A vida ganha mais sentido que a morte, não há razão aparente para sentenciar.

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